Designer by Luiz Cotta

Alice e sua Sombra

Alice não é Ágata.
Alice não é Renata, Débora, Aline, Ana e muito menos Carolina.
Alice não é bailarina, professora de forró, santa ou indulgente.
Alice é só Alice mesmo. E mais nada.
Por enquanto...

domingo, 26 de janeiro de 2014

Alice e o Buraco

Ele disse, num tom de desleixo: Há muita interferência externas a nós naquilo que tentamos fazer ‘bem feito’”.

Mas era um vazio profundo que tinha dentro do buraco do corpo dela. Era uma coisa que não tinha mais jeito. Era grande esse buraco, era dolorido, era vermelho.

Ela sentia uma espécie de angustia que alguns diriam: “menina, você tem que cuidar disso”, mas que não passava. Aumentava a cada dia e a cada vez que ela tentava desafiar esse monstro desacordado. Porque era um monstro que arrastava correntes se acordado.

Sentia-se menina indefesa e ele não estava aí para ajuda-la a espantar o bicho papão. O bicho a importunava e ele não a abraçava pra estancar o medo e controlar a dor do barulho das correntes se arrastando.

Esse “monstro buraco vermelho era bravo, falava alto e a fazia chorar. Ela só queria ser mais forte que ele, mas era fraca e boba e temia tanto que não levantava a voz e nem a cabeça.

Quando ele não estava por perto... Ela se bastava quando ele dormia. Era cheia de pompas, cheia dela, cheia de Alice, impetuosa e decidida. Mas ele, o que não lhe dava atenção nem carinho, a fazia se sentir um nadinha, uma coisinha inútil.

Ao mesmo tempo em que ela queria viver sem o buraco, ele tratava de crescer mais e se fazer presente como uma dor aguda no estomago. Ele estava nela, era dela, fazia parte do que ela era, o buraco. Ela queria vomitar o monstro e andar pra frente.

E ele disse: “Há muita interferência externas a nós naquilo que tentamos fazer ‘bem feito’”.

Ela sorriu e deixou cair uma lágrima.


terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Alice Sufocada

Gritava suas lembranças ruins para que saíssem dela e lhe dessem espaço para a calmaria que não haveria de tardar depois da turbulência.

Eram gritos de alívio, palavras sem nome que explicasse a vontade de abrir o peito pra dizer: senti. Senti, doeu, ardeu nos olhos, apertou o peito, mas senti. Com toda a intensidade que é sentir. Senti chorando, senti amando, me decepcionando, me traindo. Senti sem sentir pena. Do que haveria de se envergonhar? Tinha envelhecido dez mil anos nos últimos tempos. Mas a juventude lhe era amiga e fiel escudeira e já iniciara o processo de renovar Alice depois do casulo.

Alice finalmente respirava. Tinha fôlego e não sofria com aquela asma maluca de ficar presa numa gaiola e nem era troféu de ninguém. Não se culpava. Sabia que hoje era Alice porque sobreviveu aquilo. Ela era resultado das convenções e fruto da história. E agora lhe cabia era amaldiçoar as pragas que o destino lhe reservava e ir de encontro a ele dizendo que quem mandava naquela porra era ela!

Cansada de medir esforços em pisar em ovos de codorna, Alice emergia de um afogamento e queria respirar o mundo. Queria era paz e o que mais viesse com ela. Saindo desta incubadora que era detetive de todos os seus sonhos, Alice era livre. Livre de pecados, livre no mundo, livre de andar despida de seus próprios pre-conceitos. E não era o outro o imperador das ordens. Era ela que tanto clamava. E era uma delícia estar só, mesmo com tantos por perto.

Alice prendia a respiração e tragava fundo o ar dos seus pulmões. Prendia os cabelos num coque no alto da cabeça e criava seu próprio samba pra se desfilar, isso de "se bastar". Decidiu, portanto: ela não dependeria de demais ninguém. Muito menos de dele. Deixou um recado frio na secretaria eletrônica e tratou de ser feliz.
E saiu rebolando.

sábado, 4 de janeiro de 2014

...

Alice disse então: "A vida segue melhor sem você".
E só.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Alice e a Estrada

E eram muitas coisas pra arrumar.
Depois de tudo, era a chave quebrada no buraco da fechadura, o box do banheiro fora do lugar e um lugar ao sol onde pudesse colocar o coração para um descanso que lhe tirava por vezes o ar. E era um armário sem ordem, uma louça pra lavar, um pedido de desculpas e uma vontade de colo que nunca ousou lhe faltar. Era um banho refrescante com aquele sabonete novo, a gaveta emperrada a arrumar. Alice vagava entre os pensamentos "fazer nada" e "por onde começar". Essa faxina d'alma era coisa que só depois de tanta água lavada ficava possível tratar. Alice inventou de arrumar as escadas e se livrou daquele curto circuito que vazava fumaça pelo lustre do quarto. Colocou as roupas sujas pra lavar e tratou do coração parar de esperar. Mudou a decoração, usou taças novas, trocou de ano e de cabelo. Escutou fogos de artifício pela primeira vez e viu como era linda a sensação do peito vibrar. Trocou as fotos do mural, deu uma ajeitada nos livros, tomou um gole da taça de vinho e um trago do seu talvez último cigarro. Olhou praquele mundão cheio de estradas a atalhos e resolveu que chegava de ficar parada no mesmo lugar. E foi. Decidido ir por qualquer canto. Na porta deixou um recado simples dizendo FUI. E foi sem olhar pra trás.

Janela da alma... E sombra.

Janela da alma... E sombra.

Quem?

O que disse Richard Pekny