Designer by Luiz Cotta

Alice e sua Sombra

Alice não é Ágata.
Alice não é Renata, Débora, Aline, Ana e muito menos Carolina.
Alice não é bailarina, professora de forró, santa ou indulgente.
Alice é só Alice mesmo. E mais nada.
Por enquanto...

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Alice retrô

Em tempos da internet das coisas, da inteligência artificial, da automatização de quase tudo, ela achou tão linda a possibilidade de ter sua bicicleta em estilo retrô que não pensou duas vezes! Colocou logo a cestinha de vime, o assento de couro com três molas, pedais em alumínio e uma buzina fofa. Parecia com aquela sua segunda bicicleta, uma azul que seus pais compraram e trocaram pela primeira, aquela toda no estilo militar, que escolhera aos três anos. Na época não tinha gostado da troca. Hoje, se via voltando a um passado distante e, em conversa com seu pai no telefone, se viu dizer que o mais legal era deixar o carro em casa e colocar a mochila na cestinha junto às flores colhidas no caminho de pedras enquanto pedalava para o trabalho.
Haveria quem a achasse louca. Mas essa era a parte que não mudava. Pelo menos seria uma louca consciente. Emitiria menos gases, andaria sempre à direita como havia aprendido desde menina. Sim, faria uso das luzes quando do entardecer. E, no caso de uma parada habitual para um vinho, não haveria problema com bafômetro. Estava feliz. Não era de esportes. Mas era de ser diferente. E era de ser só dela.

Ajeitou girassóis na cesta, aprontou a mochila, calçou uma sapatilha e foi. Aquilo de se desconectar era bom. Buzinou. E sorriu.

Lhe faltariam rodinhas?

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Alice e o Grupo - Isso que era Amor

Ela estava chateada com aquilo tudo. Aquilo de tanta gente sabida, de tanta gente conhecedora de tantas coisas que terminavam em desentendimentos. Alguns diziam-se isso, outros aquilo, mas ninguém dizia-se “a gente “. Que coisa chata. Ela queria mesmo era a liberdade de pegar uma rosa vermelha na roseira da avó e enfeitar a mesa do almoço que parecia que nem ia mais acontecer. Eram muitas telas ligadas. Das tv’s, dos notebook’s, dos celulares. Ela queria todos sentados à mesa, com taças elegantes de vinho tinto, copos de uísque, latas de cerveja e risadas soltas. Ela queria a poesia que outrora trazia os violões e as cantigas e não os desfalques daquele detentores das verdades. Por isso tinha marcado aquele almoço-jantar, com amigos e familiares. Por isso ainda tentava, um tanto sem jeito, unir fracos e oprimidos-todos, naquele bem comum-meio-refeição-união-reunião. Que frustração. Henrique estava mal com Mariana, que andava descontente com Malu, que, por sua vez, se desentendeu com Débora que, mesmo muito amiga de Aline, não conseguia se acertar com Marcio, casado com Bruno. Já Alexandre e Ana, tão tranquilos antes, agora não aceitavam mais a relação e temiam que influenciassem os pequenos Marco e Simone. Alice estava brava com todos que eram tão desiguais porém juntos antes mas que agora estavam tão etna-mente desunidos. Ou por classes, cores, credos ou outras diferenças que os tornavam tão multilindos. Estava indignada com eles ou até consigo mesma. Seria assim pra sempre? Teria sido sempre assim, mas não havia percebido?

De qualquer forma, foi ao jardim da casa da avó, pegou aquela única rosa vermelha, algumas amarelas e encontrou uma branca solitária, recentemente brotada. Colocou na mesa, no centro. Serviu o vinho, o uísque, as cervejas e se sentou.
Aguardou. Alguns vieram. Desligaram-se as telas, mesmo que não se tivesse pedido. O grupo, diminuto, cercado de desconforto, se sentou.

Aos poucos, as crianças puxaram assunto. Isabella e Ike começaram a brincar. Karinna e Viviane pediram a Joice batatas fritas. E acabaram todos se servindo. Rodrigo passou aos pequenos as maçãs colhidas no pé e Juliana fez os pratos dos bebês. O que era estranho se des-transformou e novamente fez-se aquele típico encontro. Todos comeram e beberam. Sentaram-se à lareira mais tarde e riram. Recitaram poemas, tocaram violão, clarinete e piano. Conversaram a luz de velas e as crianças dormiram, exaustas. Alice deu as mãos a Diego e riu por entre os dentes. Não mais pensou no desenrolar das coisas. Só se deixou levar e sentiu o gostoso daquilo que era o “estar”. O grupo, menor que de costume, acabou por ficar mais conciso, unido, e mais bonito até. Continuou multi, diverso, bagunçadente divertido e tolerante. Era lindo. É. Era isso. Era lindo. Sentou-se no seu canto preferido, pegou seu gato no colo, acendeu um cigarro e contemplou a noite pela varanda. Pensou: Aquilo sim era amor.

Janela da alma... E sombra.

Janela da alma... E sombra.

Quem?

O que disse Richard Pekny